
3855/2023
Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região 395
Data da Disponibilização: Quinta-feira, 23 de Novembro de 2023
fundamentais da pessoa humana, cabendo-lhe mais e,
sobretudo, torná-los efetivos, não só em face do próprio poder
estatal, diante de sua eficácia vertical, mas também dos
particulares, em sintonia com a doutrina moderna das eficácias
horizontal e diagonal dos direitos fundamentais, aplicáveis de
forma direta e imediata (art. 5º, § 1º, da Constituição Federal). 2.
Nesse passo, deve ser assegurado um conjunto de garantias
processuais e procedimentais, seja de natureza judiciária, seja
de natureza administrativa, como é o caso da criação e da
organização de um sistema de acesso à Justiça efetivo, entre
os quais se destacam, no ordenamento jurídico, as garantias
de acesso ao Poder Judiciário e de prestação, pelo Estado, da
assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem
insuficiência de recursos, insculpidas, respectivamente, nos
incs. XXXV e LXXIV do art. 5º da CF. 3. É cediço que um dos
principais obstáculos comumente associados ao acesso à
Justiça é o de ordem econômica, conforme já apregoavam
Mauro Cappelletti e Bryant Garth em sua clássica obra Acesso
à justiça, desenvolvida a partir de pesquisas que
demonstraram que uma das primeiras barreiras à sua
efetivação são os gastos econômicos do processo, relativos ao
alto custo das despesas processuais sucumbenciais, como
custas judiciais e honorários. Isso acarretou a primeira onda
dos movimentos renovatórios do acesso à Justiça no curso do
século XX, caracterizada pela assistência jurídica integral e
gratuita aos pobres. Com isso, percebe-se que o benefício da
gratuidade da Justiça visa dar máxima efetividade ao próprio
direito de acesso à Justiça, ao viabilizar a sua concretização
aos necessitados. 4. O direito de acesso à Justiça também é
reconhecido na ordem jurídica internacional como direito
humano, sendo garantido pelos arts. 8 e 25 da Convenção
Americana de Direitos Humanos de 1969 (CADH), conhecida
como Pacto de São José da Costa Rica, em especial pelo seu
art. 8. 1. Disposições similares são encontradas nos arts. 8 e 10
da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948
(DUDH) e no art. 14.1 do Pacto Internacional sobre Direitos
Civis e Políticos de 1966 (PIDCP). 5. É preciso, ainda, salientar
que, conforme aponta a doutrina, o art. 5º, LXXIV, da CF dispõe
sobre três institutos distintos, quais sejam: a Justiça gratuita, a
assistência judiciária e a assistência jurídica. Enquanto a
assistência judiciária implica a gratuidade da representação
técnica para a defesa em Juízo do assistido, a Justiça gratuita
refere-se às despesas do processo, significando a isenção de
toda e qualquer despesa necessária ao pleno exercício das
faculdades processuais, ainda que a parte esteja assistida por
advogado particular. Oportuna, nessa perspectiva, a lição de
Pontes de Miranda. Já a assistência jurídica integral e gratuita,
de caráter mais amplo, compreende não só a Justiça e a
assistência judiciária gratuitas, já mencionadas, mas também o
assessoramento jurídico extrajudicial. Nesse sentido são os
ensinamentos de José Carlos Barbosa Moreira. 6. A par das
assinaladas diferenças entre tais institutos, registra-se que a
concessão dos benefícios da Justiça gratuita tem fulcro
unicamente no pressuposto do estado de miserabilidade da
parte, garantindo-lhe a isenção de todas as despesas
processuais, como custas, honorários periciais e honorários
advocatícios sucumbenciais. 7. Depreende-se, no entanto, do §
4º do art. 791-A da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467/2017, que
ele estende a aplicação da regra da sucumbência ao
beneficiário da Justiça gratuita, determinando a compensação
de créditos capazes de suportar a despesa no processo em
comento com aqueles obtidos nele mesmo ou em outro
processo, sendo que, na hipótese de inexistência de créditos
suficientes para compensar o ônus da sucumbência, as
obrigações dela decorrentes ficarão sob condição suspensiva
de exigibilidade. 8. Ocorre que a mera existência de créditos
judiciais, obtidos em processos trabalhistas ou de outra
natureza, não é suficiente para afastar a situação de pobreza
em que se encontrava a parte autora, no momento em que
foram reconhecidas as condições para o exercício do seu
direito fundamental à gratuidade da Justiça, constituindo a
medida imposta pelo mencionado dispositivo celetista
verdadeira inibição processual à fruição, pelo trabalhador, de
seus direitos sociais assegurados pela ordem jurídica,
sobretudo considerando que a Justiça do Trabalho ampara, em
grande parte, a classe dos trabalhadores que justamente estão
em situação de desemprego. 9. Portanto, a imposição ao
beneficiário da Justiça gratuita do pagamento de despesas
processuais de sucumbência, inclusive com empenho de
créditos auferidos no feito ou em outro processo trabalhista,
sem que esteja descartada a condição de pobreza que
justificou a concessão do benefício, resulta em flagrante
ofensa aos direitos fundamentais e aos princípios do acesso à
Justiça e da assistência jurídica integral e gratuita, insculpidos
nos incs. XXXV e LXXIV do art. 5º da CF, e aos direitos
humanos sufragados nas normas internacionais já
mencionadas. 10. De igual modo, a norma do § 4º do art. 791-A
da CLT viola os princípios da isonomia e da não discriminação,
consagrados nos arts. 3º, III e IV, e 5º, caput, da CF, e também
em diversos diplomas internacionais (arts. 1, 2 e 7 da DUDH;
arts. 2.1, 3 e 26 do PIDCP; arts. 2.2 e 3 do PIDESC. Pacto
Internacional sobre Direitos Econômicos; art. 2 da Declaração
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