PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 13ª REGIÃO
CENTRO DE INTELIGÊNCIA
NOTA TÉCNICA/CI-TRT13 Nº 003/2022
João Pessoa, 02 de agosto de 2022.
Assunto: Honorários sucumbenciais na Justiça do Trabalho após o julgamento
da ADI nº 5.766.
HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS NA JUSTIÇA DO
TRABALHO. CONDENAÇÃO DO BENEFICIÁRIO DA
JUSTIÇA GRATUITA APÓS O JULGAMENTO DA AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.766.
ELUCIDAÇÕES.
1. RELATÓRIO
Trata-se de edição de nota técnica, com o objetivo de elucidar a questão
da condenação do beneficiário da justiça gratuita ao pagamento de honorários
sucumbenciais (periciais e/ou advocatícios) na Justiça do Trabalho, após o
julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.766 pelo Supremo
Tribunal Federal.
2. FUNDAMENTAÇÃO
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2.1 Honorários sucumbenciais na Justiça do Trabalho após o julgamento da
ADI nº 5.766.
Com a apreciação da ADI 5.766 pelo Supremo Tribunal Federal, e a
publicação da ata e decisão do julgamento no final de 2021, parecia que a
condenação do beneficiário da justiça gratuita em honorários sucumbenciais na
Justiça do Trabalho havia sido totalmente expurgada do ordenamento jurídico.
Confira-se:
“Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente o
pedido formulado na ação direta, para declarar inconstitucionais os
arts. 790-B, caput e § 4º, e 791-A, § 4º, da Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT), vencidos, em parte, os Ministros Roberto Barroso
(Relator), Luiz Fux (Presidente), Nunes Marques e Gilmar Mendes. Por
maioria, julgou improcedente a ação no tocante ao art. 844, § 2º, da
CLT, declarando-o constitucional, vencidos os Ministros Edson Fachin,
Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Redigirá o acórdão o Ministro
Alexandre de Moraes”. Plenário, 20.10.2021 (Sessão realizada por
videoconferência – Resolução 672/2020/STF).
Ocorre que, com a publicação da íntegra do acórdão, em 03.05.2022,
percebeu-se que, na verdade, não foi declarada a inconstitucionalidade do
pagamento de honorários sucumbenciais (advocatícios ou periciais), pelo
beneficiário da justiça gratuita; mas sim a condenação automática a tal
pagamento, simplesmente por ter o reclamante obtido créditos em juízo capazes
de suportar a despesa, ainda que em outro processo.
Isso porque o simples fato de ter obtido esses créditos não o faz deixar de
ser hipossuficiente, condição que deve ser levada em consideração para a
condenação às verbas de sucumbência. Ou seja, o beneficiário da justiça gratuita
deve continuar a ser condenado ao pagamento dos honorários sucumbenciais,
porém essa condenação ficará sempre com a exigibilidade suspensa pelo prazo
de dois anos, ficando o pagamento condicionado à demonstração de que a
situação de hipossuficiência da parte foi modificada. Desse modo, o que deixa de
existir após a decisão da ADI 5.766 é a compensação automática dos
honorários de sucumbência com os créditos que porventura o reclamante tenha
obtido em juízo.
É possível extrair tal conclusão, primeiramente, a partir do item 1 da
ementa do acórdão de julgamento:
CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI
13.467/2017. REFORMA TRABALHISTA. REGRAS SOBRE GRATUIDADE DE
JUSTIÇA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DE ÔNUS
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SUCUMBENCIAIS EM HIPÓTESES ESPECÍFICAS. ALEGAÇÕES DE
VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA, INAFASTABILIDADE DA
JURISDIÇÃO, ACESSO À JUSTIÇA, SOLIDARIEDADE SOCIAL E DIREITO
SOCIAL À ASSISTÊNCIA JURÍDICA GRATUITA. MARGEM DE
CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CRITÉRIOS DE RACIONALIZAÇÃO DA
PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AÇÃO DIRETA JULGADA PARCIALMENTE
PROCEDENTE.
1. É inconstitucional a legislação que presume a perda da condição
de hipossuficiência econômica para efeito de aplicação do
benefício de gratuidade de justiça, apenas em razão da apuração
de créditos em favor do trabalhador em outra relação processual,
dispensado o empregador do ônus processual de comprovar
eventual modificação na capacidade econômica do beneficiário.
2. A ausência injustificada à audiência de julgamento frustra o exercício
da jurisdição e acarreta prejuízos materiais para o órgão judiciário e
para a parte reclamada, o que não se coaduna com deveres mínimos
de boa-fé, cooperação e lealdade processual, mostrando-se
proporcional a restrição do benefício de gratuidade de justiça nessa
hipótese.
3. Ação Direta julgada parcialmente procedente. - grifos nossos.
Ademais, restou consignado no dispositivo do voto do Ministro Alexandre
de Moraes, redator do acórdão:
Em vista do exposto, CONHEÇO da Ação Direta e, no mérito, julgo
PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para declarar a
inconstitucionalidade da expressão ainda que beneficiária da
justiça gratuita, constante do caput do art. 790-B; para declarar a
inconstitucionalidade do § do mesmo art. 790-B; declarar a
inconstitucionalidade da expressão desde que não tenha obtido em
juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a
despesa, constante do § 4º do art. 791-A; para declarar constitucional o
art. 844, § 2º, todos da CLT, com a redação dada pela Lei 13.467/2017.
É o voto. - grifos nossos.
E, para não restarem dúvidas, colacionam-se trechos do voto do Min.
Alexandre de Moraes, que fazem transparecer a ratio decidendi do julgado:
(…) A partir desse desenho de conformação legislativa que o Congresso
Nacional fez da previsão constitucional (art. 5º, LXXIV, da CF) da garantia
da gratuidade aos que comprovarem insuficiência de recursos, a
concessão de tratamento diferenciado somente se sustenta, por óbvio,
quando permanece a situação de vulnerabilidade, hipótese essa que
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torna justa a concessão da assistência de quem dela necessite. Essa é a
dinâmica, como disse, inclusive, da leitura do art. 98 do CPC.
O tratamento da gratuidade judiciária do processo civil também admite
a responsabilização do beneficiário sucumbente pelo pagamento das
despesas processuais, bem como admite, no caso concreto, a
modulação dos benefícios concedidos à parte vulnerável, a fim de
proporcionar tratamento benéfico à real necessidade do jurisdicionado.
Ou seja, deve ficar comprovado (e, aqui, acho importante, porque esse
é o corte que farei também para a questão trabalhista) que aquela
situação de vulnerabilidade não mais existe. Não algo matemático: era
vulnerável, ganhou dois, tem de pagar um, então, fica com um, sem
saber se o fato de ter recebido dois torna-o ou não vulnerável.
O que o ordenamento jurídico estabelece é que, uma vez comprovada a
cessação da situação de vulnerabilidade, seria possível, mesmo na
Justiça comum, nos termos art. 98, a modulação, a possibilidade de
redução dos benefícios antecipadamente conhecidos.
Isso existia no âmbito do processo judicial trabalhista. Mesmo antes
da edição das normas agora impugnadas, a regulamentação no âmbito
do processo judicial trabalhista convergia exatamente para essa
disciplina da gratuidade, porque permitia, possibilitava, a
representação do reclamante por seu sindicato. A Lei 5.584 previa o
pagamento de honorários de sucumbência; definiu um patamar
objetivo para a aferição da insuficiência de recursos, no caso, salário
igual ou inferior ao dobro do mínimo legal referido no art. 14, § 1º,
também da citada Lei 5.584; e estabelecia a isenção do pagamento de
honorários periciais até a edição dessa nova lei, a da chamada Reforma
Trabalhista, que teve o propósito (estamos julgando aqui diversas
impugnações, diversos pontos diferentes dessa Reforma Trabalhista de
2017 - se obteve ou não, isso deverá ser analisado com o tempo),
modernizar o tratamento dessa relação processual trabalhista e
pretendeu alterar esse panorama.
Parece-me importante verificar aqui se essa alteração uma vez
verificada que toda a estrutura da gratuidade, garantida
constitucionalmente, exige a hipossuficiência, mas também, e mais
importante, a cessação dessa gratuidade exige comprovação do
término da hipossuficiência feita pela Reforma Trabalhista foi
razoável, foi proporcional, foi adequada. Ou seja, se, apesar das
alterações, mantém-se o pleno acesso ao Poder Judiciário; se, apesar
das alterações, mantém-se a proteção ao hipossuficiente que tem
direito constitucional à justiça gratuita; ou se, por outro lado, aquele
que entra na ação hipossuficiente, ganha, e continua hipossuficiente,
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mesmo assim perde o que ganha de forma automática, sem se
demonstrar a hipossuficiência. Como o próprio texto legal dispõe,
somente se o beneficiário da justiça gratuita não obtiver em juízo
créditos capazes de suportar a despesa – ainda que em outro processo
– a União responderá pelo encargo.
É aquela questão que disse anteriormente, de conta matemática. Então,
é hipossuficiente, os honorários periciais custaram cinco, ele ganhou
dois, tem que pagar dois, fica devendo três. Mas, será que, ganhando
dois, ele não se tornou ou não continuou sendo hipossuficiente? Essa é
a questão. Vai demandar somente para pagar honorários periciais se o
móvel da lei, se a razão da lei, foi impedir que pleiteie seu direito,
parece-me um obstáculo contrário à previsão constitucional. As
inovações promovidas pela lei, em sua maioria, trataram exatamente
disso, de alterações desses importantíssimos pontos: majorar o marco
objetivo para a aferição da insuficiência de recursos para o patamar de
40% do teto do RGPS art. 790, § 3º, da Reforma Trabalhista –; permitir
o parcelamento de honorários periciais e a responsabilização do
beneficiário de gratuidade que vem, posteriormente, a gozar de
insuficiência de recursos para arcar com os encargos da sucumbência.
Deve ser analisado se esses pontos foram tratados com razoabilidade:
o pagamento de honorários periciais, mesmo do beneficiário da
gratuidade da Justiça; a responsabilização da parte beneficiária pelos
encargos da sucumbência na hipótese em que favorecida por
condenação em outro processo (aqui uma compensação processual,
uma detração, se fosse no campo penal; “você ganhou esse, cuidado
para não entrar com aquele, porque, se perder aquele, você perde o
que você ganhou nesse” - se isso for entendido como um obstáculo a
pleitear seus direitos, parece-me que fere a Constituição); e pagamento
de custas em caso de ausência injustificada à audiência de julgamento.
(…)
Nesse ponto, Presidente, adianto que não entendo razoáveis os arts
790-B, § 4º, e 791-A, § 4º. Não entendo razoável a responsabilização
nua e crua, sem análise se a hipossuficiência do beneficiário da
justiça gratuita pelo pagamento de honorários periciais deixou ou
não de existir, inclusive com créditos obtidos em outro processo.
Da mesma forma, não entendo razoável e proporcional o
pagamento de honorários de sucumbência pelo beneficiário da
justiça gratuita, sem demonstrar-se que ele deixou de ser
hipossuficiente, ou seja, essa compensação processual sem se
verificar se a hipossuficiência permanece ou não.
A deferência de tratamento permitida pela Constituição se baseia
exatamente nessa admissão de hipossuficiência. Simplesmente
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entender que, por ser vencedor em um outro processo ou nesse,
pode pagar a perícia, e, só por ser vencedor no processo, já o torna
suficiente, autossuficiente, seria uma presunção absoluta da lei
que, no meu entendimento, fere a razoabilidade e o art. 5º, XXIV.
Os dois dispositivos, tanto o caput quanto os parágrafos, estão
estabelecendo obstáculos à efetiva aplicação do art. 5º, LXXIV – repito:
"Art.5º ......................................................................…
LXXIV o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que
comprovarem insuficiência de recursos;"
Uma eventual vitória judicial em outro ambiente processual não
descaracteriza, por si só, a condição de hipossuficiência. Não
nenhuma razão para entender que o proveito econômico apurado no
outro processo seja suficiente para alterar a condição econômica do
jurisdicionado, em vista da infinidade de situações a se verificar em
acda [sic] caso. Nessa hipótese em que se pretende utilizar o
proveito de uma ação para arcar com a sucumbência de outro
processo uma “compensação” –, o resultado prático é mitigar a
sua vitória e manter a sua condição de hipossuficiência.
Ora, onde está a prova de que cessou a hipossuficiência para afastar os
benefícios da justiça gratuita? A forma como a lei estabeleceu a
incidência de encargos quanto a honorários de perícia e da
sucumbência como bem destacado pelo Ministro EDSON FACHIN em
seu voto divergente, e também no parecer da Procuradoria-Geral da
República feriu a razoabilidade e a proporcionalidade e estipulam
restrições inconstitucionais, inclusive pela sua forma absoluta de
aplicação da garantia da gratuidade judiciária aos que comprovam
insuficiência de recurso (…) - grifos nossos.
Impende trazer à colação, ainda, trecho da decisão monocrática proferida
pelo Ministro Alexandre de Moraes na Reclamação 52837/PB, na qual restou
explicitado, de forma cristalina:
“Destaque-se: o que esta CORTE vedou foi o automático afastamento da
condição de hipossuficiência da parte como consequência lógica da
obtenção de valores em juízo, e não a possibilidade de haver
condenação em honorários advocatícios (os quais podem ser
arbitrados, ficando sob condição suspensiva de exigibilidade)”.
Logo, os artigos 790-B e 791-A da CLT devem passar a ser vistos da
seguinte forma:
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Art. 790-B. A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais
é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, ainda que
beneficiária da justiça gratuita.
(…)
§ 4
o
Somente no caso em que o beneficiário da justiça gratuita não
tenha obtido em juízo créditos capazes de suportar a despesa referida
no caput, ainda que em outro processo, a União responderá pelo
encargo.
Art. 791-A. (…)
§ 4
o
Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha
obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de
suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência
ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão
ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado
da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir
a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de
gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do
beneficiário.
Por fim, importante registrar que os embargos de declaração opostos
contra o acórdão de julgamento da ADI 5.766 foram rejeitados (DATA DE
PUBLICAÇÃO DJE 29/06/2022 ATA 112/2022. DJE 126, divulgado em
28/06/2022).
3. CONCLUSÃO
O Centro de Inteligência do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região,
com fulcro no Ato TRT13 SGP 117, de 04 de novembro de 2020, e
considerando as diretrizes expostas, propõe:
1) esclarecer que o STF, ao julgar a ADI 5.766, não declarou a
inconstitucionalidade do pagamento de honorários sucumbenciais
(advocatícios ou periciais), pelo beneficiário da justiça gratuita na Justiça
do Trabalho, mas apenas a condenação automática a tal pagamento, pelo
simples fato de o reclamante ter obtido em juízo créditos capazes de
suportar a despesa, ainda que em outro processo;
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2) encaminhar esta Nota Técnica a todas as unidades judiciárias de e
graus, para fins informativos;
3) encaminhar o teor da presente Nota Técnica à Assessoria de Comunicação
Social (ACS) para confeccionar notícia a ser divulgada no sítio do Tribunal.
Composição
Desembargador Presidente - Coordenador do Centro de Inteligência
Desembargador Vice-Presidente e Corregedor
Juiz Auxiliar da Presidência
Juiz Auxiliar da Corregedoria
Secretário-Geral Judiciário
Coordenadora de Inteligência e Gestão Negocial
Chefe do Núcleo de Gestão de Precedentes e Ações Coletivas
Leonardo José Videres Trajano
Desembargador Presidente do TRT13
Coordenador do Centro de Inteligência
LEONARDO
JOSE VIDERES
TRAJANO:101
308970
Assinado de forma
digital por LEONARDO
JOSE VIDERES
TRAJANO:101308970
Dados: 2022.08.30
12:00:37 -03'00'
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ANEXO ÚNICO
NOTA TÉCNICA/CI-TRT13 Nº 003/2022
RESUMO
Assunto:
Honorários sucumbenciais na Justiça do Trabalho após o julgamento da
ADI nº 5.766.
Problemática x O que foi decidido:
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Como devem passar a ser lidos os artigos 790-B e 791-A
da CLT:
Art. 790-B. A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da
parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, ainda que beneficiária da
justiça gratuita.
(...)
§ 4o Somente no caso em que o beneficiário da justiça gratuita não tenha
obtido em juízo créditos capazes de suportar a despesa referida no caput,
ainda que em outro processo, a União responderá pelo encargo.
Art. 791-A. (...)
§ 4o Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em
juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa,
as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva
de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos
subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor
demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que
justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais
obrigações do beneficiário.