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“A deficiência é inerente à diversidade humana e assim deve ser compreendida”, afirma o ministro do TST, Cláudio Brandão

Ministro concedeu entrevista exclusiva ao TRT-13 em decorrência do Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, celebrado nesta terça (21)
publicado: 21/09/2021 12h23 última modificação: 23/09/2021 11h05

O Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, comemorado nesta terça-feira (21), lança uma luz acerca da importância do debate sobre os direitos da pessoa com deficiência e a sua inclusão na sociedade. Para o ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Cláudio Mascarenhas Brandão, a formação diversa da comunidade humana é um elemento próprio da sua condição e, portanto, assim deve ser compreendida a deficiência: como inerente à diversidade humana. “A deficiência não deve ser vista como um defeito ou um mal causado a uma pessoa. Se a pessoa com deficiência tem uma limitação, é dever do Estado e da sociedade assegurar as condições para que possam exercer seus direitos com plenitude”, afirmou. A temática não é distante do ministro, que é doutorando em Ciências Jurídicas pela Universidade Autônoma de Lisboa e estuda os impactos da reforma trabalhista no direito à inclusão pelo trabalho da pessoa com deficiência.

Durante entrevista concedida ao TRT-13, o ministro Cláudio Brandão defendeu o direito à igualdade como o principal assegurado às pessoas com deficiência e comentou sobre as principais normativas voltadas a este público, a exemplo da Convenção da ONU editada em 2006 e da Lei nº13.146/2015, conhecida como Lei Brasileira de Inclusão (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Confira, abaixo, a entrevista:

Pergunta: Ministro, quais são os principais direitos das pessoas com deficiência no âmbito do trabalho?

Ministro Cláudio Brandão: O principal direito assegurado à pessoa com deficiência é o direito à igualdade, na vertente de igualdade de oportunidades. A Convenção da Organização das Nações Unidas sobre direitos de pessoas com deficiência, editada em 2006 e vigente no Brasil a partir de 2009, é o primeiro tratado de direitos humanos do século XXI e é uma convenção que procurou não reconhecer novos direitos, mas estabelecer a aplicação dos direitos fundamentais das pessoas em geral às pessoas com deficiência. Nesta convenção, é assegurado o direito à igualdade de oportunidades, que, na verdade, é a vertente do direito à igualdade aplicada às pessoas com deficiência, o que significa dizer que elas têm direito a serem tratadas como pessoas iguais às quaisquer outras. No que toca ao trabalho, a convenção tem uma regra bastante ampla que diz respeito à escolha do trabalho e às condições de trabalho adequadas. Há, também, um direito interessante criado pela convenção, que é o direito à adaptação razoável, que se trata de um direito do empregado e, ao mesmo tempo, dever do empregador, no sentido de estabelecer as condições materiais, normativas e procedimentais para que o trabalho possa ser executado em plenas condições de igualdade com as demais pessoas. Esse direito é, também, materializado na Lei Brasileira de Inclusão, que detalha bastante o direito ao trabalho. Tudo isso resulta do grande e maior direito que é o direito à igualdade plena em todos os aspectos da vida.

Pergunta: Estes direitos têm sido respeitados ou há quantidade relevante de demandas na Justiça do Trabalho referentes à violação destes direitos?

Ministro: A maior demanda na Justiça do Trabalho envolvendo a pessoa com deficiência, sem dúvida, é o direito às cotas na empresa. É uma política pública estabelecida na lei previdenciária de 1991 e que diz que um determinado percentual de vagas, que varia de acordo com número de empregados de determinada empresa, deve ser reservado a pessoas com deficiência. Em torno do cumprimento dessa política pública de inclusão é que acontecem as maiores demandas na Justiça do Trabalho. O não cumprimento da cota, empregado que é dispensado sem que a empresa observe o cumprimento da cota e autos de infração que são lavrados porque a empresa não observou a cota são as principais questões jurídicas que decorrem dessa política pública de inclusão da pessoa com deficiência criada no Brasil em 1991.

Pergunta: E como tem sido o entendimento da Justiça do Trabalho no tocante a essas violações?

Ministro: Geralmente, a Justiça do Trabalho tem o entendimento de que a cota deve ser observada, embora, a meu sentir e com o devido respeito a quem pensa de maneira contrária, acho que ainda há pouca incidência da Convenção da ONU nas decisões. É muito comum, por exemplo, encontrar decisões que dizem que a empresa está desobrigada a cumprir a cota quando ela convoca pessoas com deficiência por meio de editais em jornais, faz contatos com entidades que tratam do assunto ou ONGs que cuidam de interesses de pessoas com deficiência. Mas, para mim, o grande equívoco das decisões é não observar a mudança de paradigma que aconteceu em 2009 no Brasil e, mais tarde, em 2015, com a Lei Brasileira da Inclusão. Trata-se da obrigatoriedade de fornecimento dos meios necessários para a inclusão por intermédio da acessibilidade ampla, ou seja, não apenas viabilizar o ingresso da pessoa fisicamente no trabalho. A acessibilidade é conhecida por ser um direito transversal porque é por meio dela que se assegura o exercício de outros direitos.

Pergunta: Por que é importante amparar, através de legislação, as pessoas com deficiência no trabalho?

Ministro: Simplesmente porque são pessoas iguais. O direito à igualdade, estabelecido no artigo 5º da Constituição Federal, é materializado para pessoas com deficiência de maneira um pouco diferente, ou seja, se a pessoa tem um impedimento que dificulta o exercício de seu direito, cabe ao Estado viabilizar condições para que essa pessoa tenha direito de exercer na sua plenitude. Isso depende, muitas vezes, de apoio, seja de formação, material ou no que toca ao fornecimento de serviços. Neste sentido, não se trata de um ato de benevolência, de condescendência ou mesmo de piedade, pelo contrário, é um direito assegurado pela CF à pessoa com deficiência. É importante ressaltar que a Convenção da ONU foi aprovada no Brasil com status de Emenda Constitucional, o que quer dizer que é uma norma que se encontra inserida na Constituição e, portanto, afasta quaisquer outras que com ela se tornem incompatíveis. Então, a importância no amparo aos direitos é porque é uma pessoa igual a cada um de nós.

Pergunta: Neste dia 21, comemora-se o dia nacional de luta da pessoa com deficiência. Há o que comemorar, de fato? E o que ainda falta em termos de avanço nos direitos da pessoa com deficiência?

Ministro: O dia 21 de setembro, de fato, é um dia importante e deve ser comemorado por conta da necessidade de chamar a atenção da sociedade para o reconhecimento do direito à inclusão. Então, a comemoração do dia é importante porque é uma data simbólica que procura chamar a atenção da sociedade para toda a realidade de discriminação pela qual passa a pessoa com deficiência. Se fizermos uma trajetória histórica, veremos que a pessoa com deficiência sempre foi tratada de maneira diferente. Ela era objeto de sacrifício na antiguidade, já foi alvo de certo misticismo, considerado amuleto e, depois, uma pessoa anormal e, por isso, retirada do convívio social. Hoje se reconhece que são pessoas como qualquer um de nós que tem apenas características próprias que compõem a diversidade humana e, por isso, tem que estar incluídas na sociedade. Isto é importante porque iniciativas de exclusão e segregação da pessoa com deficiência são, acima de tudo, inconstitucionais, além de estarem evidentemente na contramão de toda a sociedade contemporânea, que prega a igualdade de direito, sobretudo nos países democráticos. Então, quando encontramos discussões sobre escola e salas especiais para a pessoa com deficiência, estamos indo na contramão do mundo contemporâneo e sociedades mais avançadas, que pregam a convivência com o diferente. A criança que convive em ambiente diverso será um adulto sem preconceito. Ao contrário, a criança que enxergar na outra criança com deficiência uma anormalidade, e não aquilo que é natural e próprio da vida, será um adulto preconceituoso. A igualdade vivenciada na infância será, sem dúvida, responsável por uma adolescência e fase adulta sem preconceito. Hoje é uma data que tem que comemorar sim, pois desperta a atenção da sociedade para toda a temática que envolve a pessoa com deficiência, mas, sobretudo, no que diz respeito à igualdade.

 

Celina Modesto
Assessoria de Comunicação Social do TRT-13