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Primeiro dia de webinário sobre direitos das minorias é promovido pelo TRT-13

Evento contou com a presença do ministro do TST, Lelio Bentes, e discutiu questões como raça e direitos das mulheres
publicado: 25/05/2022 08h20 última modificação: 27/05/2022 11h14

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O webinário “Direito das minorias e discriminação por gênero, raça e orientação sexual” teve sua primeira etapa realizada na manhã desta terça-feira (24). O evento, promovido pelo Comitê Gestor da Igualdade de Gênero, Raça e Diversidade do Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba (13ª Região), em parceria com a Escola Judicial (Ejud13), terá uma segunda parte no próximo dia 31 de maio, a partir das 8h30.

O seminário tem como objetivo refletir sobre as diferentes formas de discriminação na sociedade e no mundo do trabalho e sobre como o sistema de Justiça pode atuar para garantir igualdade de oportunidades a todos, sem preconceitos de gênero, raça, orientação sexual e identidade de gênero. Na abertura, o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Lelio Bentes apresentou resumidamente as questões que seriam abordadas ao longo do evento, apontou as violências que minorias sociais são submetidas e destacou a contribuição que o webinário traz para avançar as discussões em torno do tópico na perspectiva do Judiciário. 

“Não é que estejamos perdendo o trem da história, o trem já partiu. Na medida em que perdemos essa quantidade de vidas e segregamos a sociedade pela cor da sua pele, pelo seu gênero, pelas pessoas que amam, estamos muito atrás no processo civilizatório. É fundamental recuperar o tempo e os espaços perdidos. Tenho orgulho de pertencer a uma magistratura que toma a decisão de tomar esta iniciativa”, afirmou o ministro.

Na sequência, foi iniciado o primeiro painel, intitulado “Atuação do sistema de Justiça na promoção da igualdade de oportunidades”, sob mediação da juíza do trabalho e coordenadora do Comitê Gestor da Igualdade de Gênero, Raça e Diversidade do TRT-13, Ana Paula Porto. A primeira palestrante foi Lívia Santana e Sant’Anna Vaz, promotora de justiça do Ministério Público da Bahia (MPT-BA), que enfatizou a importância do que chama de letramento racial na hora de identificar questões a serem superadas pelo sistema de Justiça no que tange a questão racial.

“A quem nós atendemos e quem nós somos? A quem aplicamos Justiça neste país? Temos um perfil de homens brancos, cis, héteros e cristãos que dominam o Judiciário. A ausência de pessoas negras nesses espaços afeta nosso papel de proferir decisões. O que chamo de letramento racial não é o acesso a leituras e teorias, mas sim o entendimento do mundo a partir das lentes das relações étnico-raciais”, enfatizou. 

Para a promotora, a questão racial não é uma discussão acessória para pensar em uma Justiça mais abrangente, que atenda a todos os brasileiros, mas sim tópico central. Em sua palestra, ela resgatou informações sobre a formação do Brasil, enfatizando que cerca de 70% da história do país foi permeada pelo processo de escravização da população negra.

“O Brasil foi o último país do Ocidente a abolir a escravidão e isso se refletiu na forma a Justiça brasileira se constituiu. Houve uma perseguição a pessoas negras, com uso da ordem jurídica, para controlar esses corpos indesejados. Negros passaram décadas sem poder acessar as estruturas de educação do Brasil. É preciso reconhecer a centralidade da questão racial no Brasil”, completou Lívia, destacando a vulnerabilidade de crianças e mulheres negras, estas últimas submetidas a feminicídio e violências obstétricas.

Direitos das mulheres

A segunda palestra do webinário ficou a cargo da procuradora regional do Trabalho e coordenadora nacional da Coordigualdade do MPT-SP, Adriane Reis de Araújo, que falou sobre o impacto do trabalho reprodutivo na igualdade de oportunidades no trabalho, enfatizando que as mulheres, a despeito de todos os avanços que conquistaram, ainda têm renda 41,5% menor em relação aos homens, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) de 2019.

“A maior parte das pessoas que trabalham têm responsabilidades familiares, sejam homens ou mulheres. No entanto, esta responsabilidade familiar não tem impacto negativo na carreira dos homens”, salientou Adriane Reis de Araújo. A promotora aponta a maternidade como um dos momentos em que a mulher sofre discriminação. “Embora tenhamos no texto constitucional a garantia da estabilidade durante a maternidade, muitas mulheres são dispensadas 12 meses após o término da licença-maternidade”, completou.

Outros dados apresentados na palestra de Adriane evidenciaram a forma como o mercado de trabalho brasileiro encara a maternidade sob ótica negativa. “Cerca de 64% das mulheres com filhos até 3 anos frequentando creche tinham empregos. Quando observamos as mulheres cujos filhos não tinham como ir para uma creche, este número caiu para 43%”, pontuou.

A pandemia também afetou as trabalhadoras brasileiras. “Cerca de 7 milhões de mulheres abandonaram o mercado de trabalho desde o início da pandemia para cuidar de seus filhos. Muitas das mulheres que estiveram neste período pandêmico em estado gravídico não foram dispensadas do trabalho presencial, mesmo com este tipo de dispensa sendo garantida por lei. Para se ter uma ideia, o Brasil liderou as mortes maternas por Covid-19 no mundo, subindo de 10,5 gestante por semana para 25,8, mais que o dobro”, completou a procuradora do MPT-SP.

Para Adriane, para pensarmos em equidade de gênero, é preciso refletir sobre as relações desiguais entre eles. “O conflito de gênero revela os privilégios dos homens. As mulheres, longe de não terem o interesse ou o perfil de ocupar espaços de poder, não têm tempo, pois elas estão sobrecarregadas por tarefas que ainda são atribuídas às mulheres por uma visão patriarcal da sociedade”, analisou.

Silvana Abramo Margherito Ariano é desembargadora aposentada do TRT da 2ª Região (São Paulo) e trouxe em sua participação no webinário uma reflexão sobre as políticas públicas de promoção de igualdade na magistratura trabalhista. “A lei é a nossa ferramenta, o nosso começo e o nosso fim enquanto magistrados. Normalmente, não pensamos na lei enquanto política pública. Quando o legislativo aprova uma lei ou o executivo manda uma medida provisória, ele está fazendo uma opção política, a concretização de uma visão de mundo. Quando aplicamos a legislação, com nossa interpretação, com nossa hermenêutica, estamos construindo e reconstruindo a norma para o caso concreto e, sim, estamos fazendo política pública com nossa jurisdição, defendeu a magistrada.

A Justiça do Trabalho, na opinião de Silvana Abramo, tem avançado nessas questões com a criação de diversas comissões, além da promoção do trabalho seguro e saudável. “O nó está na incorporação de todas as ações, projetos e reflexões sobre essas atitudes discriminatórias. As relações interinstitucionais vão muito bem, mas eu vejo que ainda a capilaridade dessas ações para os magistrados e servidores e servidoras é frágil. É preciso tornar estas discussões parte do cotidiano e este webinário contribui para isso”, afirmou.

Orientações aos magistrados

O segundo painel da manhã foi mediado pela juíza do trabalho do TRT-13, coordenadora do Comitê de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral e do Assédio Sexual e gestora regional do Programa Trabalho Seguro, Mirella Cahú. O tema principal foi o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, apresentado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Para a juíza do trabalho do TRT da 10ª Região, Natália Queiroz Cabral Rodrigues, a confecção e a redação do protocolo foi o amadurecimento do sistema de Justiça, que reconheceu os preconceitos históricos. “Identificou-se a necessidade de criar uma cultura jurídica emancipatória, reconhecendo os direitos de todas as mulheres, reconhecendo o machismo, a misoginia e a homofobia em todo o âmbito do Judiciário”, pontuou.

Natália entende que o protocolo serve para tentar fazer com que os magistrados e magistradas que ocupam espaços de poder no Judiciário brasileiro consigam superar as distâncias em relação à população brasileira. “A magistratura é branca, rica, masculina e heterossexual. É uma classe que se afasta da maioria da população brasileira. Como ela pode julgar essa maioria da população sem entendê-la? Não é possível pensar em igualdade substancial sem pensar nas múltiplas vulnerabilidades”, completou a juíza.

Ao concluir este primeiro dia de webinário, a juíza do Trabalho do TRT da 5ª Região, Adriana Manta da Silva, reforça a importância do protocolo do CNJ, que atualiza e propõe uma nova reflexão sobre princípios como imparcialidade, neutralidade e objetividade no âmbito do Judiciário.

“Quem interpreta e aplica as leis no Brasil, ou seja, o Legislativo e o Judiciário, atualmente é o retrato do homem médio, branco, cis, heterosexual e rico. Não há possibilidade de sermos pessoas neutras diante de todas as vivências que acumulamos. O protocolo propõe que um julgamento imparcial depende de uma busca ativa da superação desses vieses e da hierarquização social e econômica das pessoas”, completou.

Por fim, Adriana apresentou um guia que busca orientar magistrados e magistradas no cotidiano, com base nos preceitos apresentados pelo Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. São sete passos:

Aproximação com o processo: há assimetrias de gênero, em perspectiva interseccional, no conflito apresentado?

Aproximação dos sujeitos processuais: alguma das pessoas têm algum tipo de vulnerabilidade que possa tornar uma sessão desconfortável para ela?

Medidas especiais de proteção: as partes envolvidas estão em risco de vida ou de sofrer alguma violação à integridade física e/ou psicológica?

Instrução processual: perguntas estão reproduzindo estereótipos de gênero? Perguntas podem estar causando algum tipo de re-vitimização? O ambiente proporciona algum impedimento para que o depoente se manifeste sem constrangimentos e em situação de conforto? A instrução processual está reproduzindo violências institucionais de gênero?

Valoração de provas e identificação de fatos: Minhas experiências pessoais podem estar influenciando a minha apreciação dos fatos? Posso estar dando peso a um evento que só parece importar por ideias pré-concebidas que permeiam minha visão de mundo?

Identificação de marcos normativos e precedentes: Qual marco jurídico nacional ou internacional se aplica ao caso? Qual a norma que presta maior garantia ao direito à igualdade às pessoas envolvidas no caso? A solução atende ao conteúdo constitucional?

Interpretação e aplicação do direito: interpretação não-abstrata do direito; analisar as normas impregnadas com estereótipos negativos sobre grupos subordinados, a fim de identificá-los e neutralizá-los; análise de normas diretamente discriminatórias; análise de normas indiretamente discriminatórias.

“É preciso levar este protocolo para os tribunais, as varas, mas também para a conversa cotidiana de servidores. É preciso levar essas questões também para os familiares. Mostrem esta discussão para seus filhos. É uma reflexão que precisa ser feita por todas”, reiterou a juíza do trabalho Natália Queiroz Cabral Rodrigues.

André Luiz Maia
Assessoria de Comunicação Social TRT-13